sexta-feira, 11 de maio de 2012

O Despertar do Irão - parte III

 

Bem, como já devem ter percebido, a minha vontade era transcrever para aqui o livro inteiro... ;)

como isso não é possível, tento salientar os pontos que me parecem mais relevantes, o que para mim chega a ser difícil, porque realmente o livro é todo ele muito interessante, recomendo-o sem hesitações. Depois do foco (nos posts anteriores) nos direitos das mulheres e das crianças, ou antes, na falta deles, agora, para terminar, o foco vai para um homem que tentou mudar o Irão, mas foi impedido.


Uma das coisas que aprendi com este livro (O despertar do Irão, Shirin Ebadi) foi que este país esteve à beira de se tornar bem diferente daquilo que continua afinal a ser hoje.  Na história recente do Irão já houve uma primavera, só que outros valores e interesses mais obscuros conseguiram levar a melhor.
É aqui que surge o nome de Mohammad Mossadegh, para mim um perfeito desconhecido até à leitura deste livro.
Claro que já tinha ouvido falar do Ayatollah Khomeini

assim como do Xá Reza Pahlavi

(que sempre ouvi pronunciar "palévi")

mas o nome de Mossadegh, um homem que foi tão importante para o Irão (e que poderia ter sido muito mais, se o tivessem deixado) era para mim desconhecido.

É por isso que vou ter que recuar  até 1951, ano em que Mossadegh, que desejava um Irão independente, livre e democrático,  foi nomeado primeiro-ministro.
Infelizmente para os iranianos esclarecidos e em especial para as iranianas, o seu tempo nesse cargo durou muito pouco tempo.
A 19 de Agosto de 1953, «uma voz trémula anunciava no rádio a pilhas que, após quatro dias de tumultos em Teerão, o primeiro-ministro Mohammad Mossadegh tinha sido derrubado num golpe de estado.»
Mohammad Mossadegh
E porquê?
«Os apoiantes do xá (imperador) que invadiram a estação nacional de rádio anunciaram que, com a queda de Mossadegh, o povo iraniano havia triunfado. (...) poucas pessoas partilhavam verdadeiramente deste sentimento. Para os iranianos laicos e para os religiosos, como para a classe trabalhadora e para a mais abastada, Mossadegh era muito mais do que um popular chefe de estado. Era um estimado herói nacional, uma figura digna de fervorosa veneração, um líder pronto para conduzir a sua grandiosa civilização com mais de 2500 anos de história.
Dois anos antes, em 1951, o primeiro-ministro tinha procedido à nacionalização da indústria petrolífera iraniana, até aí na realidade controlada por consórcios de petróleo do Ocidente, que extraíam e exportavam o petróleo iraniano em grandes quantidades e sob acordos que apenas atribuíam ao Irão uma ínfima parte dos lucros. Esta jogada audaciosa (...) garantiu a Mossadegh a adoração eterna dos iranianos, que o consideravam a figura de fundo da independência do Irão (...).
Perante a expansão do apoio popular ao primeiro-ministro, o xá teve de confrontar-se com a sua própria vulnerabilidade de monarca sem popularidade e apoiado apenas pelos seus generais, pelos Estados Unidos e pelo Reino Unido. As duas potências ocidentais estavam irritadas com o facto de Mossadegh ter nacionalizado a indústria petrolífera do Irão, mas esperavam o momento certo para ripostar. Em 1953, concluíram que estavam reunidas as condições para o derrubarem.
Kermit Roosevelt (neto de Theodore Roosevelt), chegou a Teerão para tranquilizar o assustadiço xá e para liderar o golpe de estado. (...)
No espaço de quatro dias, o adorado primeiro-ministro, agora derrotado, estava escondido numa cave, enquanto que o corrupto jovem xá era de novo investido de poder, agradecendo a Kermit Roosevelt numa frase que ficou célebre:
"Devo o meu trono a Deus, ao meu povo, ao meu exército, e a si."
Foi um momento profundamente humilhante para os iranianos, que assistiram à intervenção dos Estados Unidos na sua política interna, como se o seu país fosse uma espécie de fim de mundo que lhes pertencesse, sendo o seu líder escolhido ou deposto de acordo com os caprichos do presidente americano e dos conselheiros da CIA. »
Mossadegh sendo preso.
Mossadegh viria a ser acusado de traição (!). Segundo as suas próprias palavras, o seu maior pecado foi ter nacionalizado a indústria petrolífera iraniana. Foi esse "pecado" que nunca lhe perdoaram. Assim como ter querido acabar com o "sistema de exploração política e económica por parte do maior império mundial".

Durante o julgamento. Pelo ar fragilizado de Mossadegh e pelo ar dos que estão em pé, imagino o tipo de julgamento...
Toda a situação do Irão é muito complexa, e realmente, ao tomarmos conhecimento do que lá se passa, é fácil para nós criticarmos aquelas mentalidades. Mas o problema vai muito para além disso. Eles também têm que lutar contra a ingerência externa, com os grandes interesses internacionais. Hoje está provado que este golpe de estado que derrubou Mossadegh teve por trás grandes interesses económicos e políticos. Entre os responsáveis, além dos apoiantes do Xá, podemos também incluir a CIA e até a petrolífera BP... 
O que acho mais triste no meio de tudo isto é que um dos raros homens que teve a coragem de tentar mudar o Irão, acabou por ser condenado por traição, tendo passado 3 anos em prisão solitária, seguindo-se a prisão domiciliária até ao final da sua vida!!

Mossadegh morreu aos 85 anos, na sua terra natal, Ahmad Abad.
Para finalizar, uma nota que não sei se é trágica ou cómica: o juiz que o condenou chegou a anunciar a sentença de morte, mas foi dizendo que, como forma de tributo à superior misericórdia do Xá, iria reduzir a pena para três anos de prisão. Com um sistema político e judiciário corrompido a este nível, os iranianos ainda têm um longo caminho de luta pela frente.

"Estou consciente de que o meu destino servirá de exemplo no futuro, enquanto o Médio Oriente estiver a quebrar as correntes de escravatura e servidão aos interesses colonialistas." Mohammad Mossadegh

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Para quem gosta de aprofundar os temas (haverá mais "loucos" como eu??)deixo as sugestões:


Biografia de Mossadegh, em Inglês


3 comentários:

Calu Barros disse...

Claudinha,
estou esta semana num corre-corre bem grande e já havia visto e sabido da tua referência a este livro que depois de conseguir ter lido esta última parte da resenha, fiquei tentada a procurá-lo por aqui,pois tbém desconhecia todos os detalhes obscuros que vc revelou.
Super interessante.Obrigada!
Muitos bjinhos,
Calu

RUTE disse...

Olá querida caloira de numerologia :)

Pelo andar da carruagem ainda te vou ver recuar à história da Grécia antiga, ao tempo de Pitágoras e dos Pitagóricos.

A BC Amor aos Pedaços parece ter despertado uma paixão tua, antiga, por conteúdos históricos. Que interessantes postagens, minha amiga.

Obrigada por teres me ensinado umas coisinhas sobre o Irão. Quando analisamos esses pormenores é que percebemos o mundo que nos rodeia. Sem dúvida.
Beijinhos da madrinha.
Rute

Ivani disse...

Oi Claudia, muito interessante esse resumo sobre o Irã.
Acho que devo comprar o livro, para me interar melhor.
É uma civilização muito diferente de tudo o que conhecemos, fechada, e portanto curiosa.
Impressiona-me perceber o quanto os Estados Unidos estão sempre envolvidos em problemas de outros países.
O jogo de interesses, envolvendo petróleo (com certeza!) ainda trará sérias consequência para o mundo todo.
Obrigada por mais essa aula lúcida e muito bem escrita.
Beijos, tenha um lindo domingo.