sexta-feira, 25 de maio de 2012

Argentina


Hoje é um dia importante na história da Argentina, um país que eu adorava conhecer. Quando for ao Brasil, aproveito e dou um saltinho "ali ao lado", ou "ali abaixo". Fácil, não é? Sonhar não custa, e já dizia o poeta, "pelo sonho é que vamos"...

Faz 202 anos que a Argentina iniciou o seu processo de Independência, com a chamada Revolução de Maio. Hoje não quero ser muito exaustiva com os factos históricos, quem quiser ou precisar saber pormenores, é favor clicar nos links. :)

A bela cidade de Buenos Aires, e o incontornável Tango.
Buenos Aires


A capital, Buenos Aires, é famosa pelos seus monumentos, mas apesar de toda a riqueza histórica da Argentina, o que mais me atrai neste país é a sua geografia. Pela sua localização, abrangendo uma área enorme até ao extremo sul do continente, os contrastes geográficos são imensos e, na minha opinião, magníficos.

mapa da Argentina


Aconcágua, nos Andes, o ponto mais alto de todo o continente americano.



zona desértica -  Talampaya


Iguaçu, do lado argentino

Créditos desta foto ao site



Patagónia, muito perto da minha noção de paraíso.


Então é isso. Eu passo 2 ou 3 dias em Buenos Aires, mas depois vou para as montanhas, é mesmo para aí que eu quero ir. Aí sim, acredito que haja mesmo Bons Ares. E só vou parar quando chegar ao Cabo Horn.

Quem quer vir também? :)

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P.S. A minha net está a tentar ganhar o record de lentidão. Enquanto não consigo fazer uploads para o Pinterest, aproveito para criar aqui a etiqueta "Lugares que quero visitar"

terça-feira, 15 de maio de 2012

BCAP - Esperança - O Desejado



Chegámos à 3ª fase  da BCAP, desta vez dedicada à ESPERANÇA.



Ora, uma vez que as minhas anteriores participações nesta BC foram relacionadas com a História de Portugal, e para continuar na mesma linha, vou ter que reincidir (tentando não ser exaustiva...)  :)
Então, lançando um olhar ao passado, que episódio é que relacionei imediatamente com Esperança? D. Sebastião, O Desejado.

D. Sebastião, o jovem rei desaparecido em Alcácer Quibir e cujo regresso o povo português aguardou durante anos e anos, décadas e mesmo séculos. A Esperança no seu regresso manteve-se viva.
Se virmos bem, ainda hoje o aguardamos.
Pintura da autoria de Carlos Alberto Santos. Pode clicar para ampliar. Vale a pena, é um belo quadro.
O Desejado
Onde quer que, entre sombras e dizeres,

Jazas, remoto, sente-te sonhado,

E ergue-te do fundo de não-seres

Para teu novo fado!


Vem, Galaaz com pátria*, erguer de novo,

Mas já no auge da suprema prova,

A alma penitente do teu povo

À Eucharistia Nova.


Mestre da Paz, ergue teu gládio ungido,

Excalibur do Fim, em geito tal

Que sua Luz ao mundo dividido

Revele o Santo Gral!

Fernando Pessoa, Mensagem

Retrato de D. Sebastião da autoria de Cristóvão de Morais, exposto no Museu Nacional de Arte Antiga


D. Sebastião nasceu em Lisboa a 20 de Janeiro de 1554. 
Sucedeu a seu avô D. João III.
O seu nascimento era esperado com ansiedade,  pois a coroa corria o perigo de vir a ser herdada por outro neto de D. João III,  filho de Filipe II de Espanha.
 (E afinal Portugal viria mesmo a ser governado durante 60 anos pelos Filipes de Espanha)

Foi desejado antes de nascer, foi desejado depois de morrer.

D. Sebastião cresceu na convicção de que Deus o criara para grandes feitos.

Cheio do seu sonho de conquista, Portugal não lhe bastava.  Sendo o seu grande objectivo ir a África combater os mouros, a sua maior preocupação foi  reunir um exército de jovens temerários e exaltados como ele próprio.

Em Junho de 1578, dá-se a partida em direção a África. Chegam perto de Alcácer Quibir a 3 de Agosto e no dia 4, o exército português, ao que parece  esfomeado e exausto pela marcha e pelo calor,  foi completamente destroçado.

 D. Sebastião morreu em Alcácer Quibir, a 4 de Agosto de 1578.

Será? ?

É que o seu corpo desapareceu... Ora, esse facto foi mais do que suficiente para se dar início a um mito que havia de perdurar por muitas gerações. Durante os anos seguintes, o povo acreditava mesmo que ele havia de regressar, num dia de nevoeiro - o Encoberto.




Tinha nascido a lenda.


El-Rei D. Sebastião, José Cid/Quarteto 1111.
 (Para ver em ecrã completo tem que entrar no "youtube")


Estava criado o mito sebastianista, que tem povoado o imaginário colectivo do nosso povo ao longo dos séculos, e que tem servido de inspiração a escritores, poetas, pintores e outros artistas.


E agora perguntarão, mas o que tem isto a ver com Amor, já que estamos na BC Amor aos Pedaços?

E a minha resposta é: é um grande amor ou não é,  o de um povo por este Rei que, desaparecido há mais de quatro séculos, ainda continua a ser desejado? :)

Ao longo dos séculos, através de sucessivas crises, vendo-se o povo em situações difíceis, logo vem à baila D. Sebastião. Obviamente, já não ele próprio, mas o que a sua figura passou a simbolizar: o Salvador, aquele que há-de chegar, saído das brumas, para nos salvar da desgraça e nos reconduzir à grandeza perdida.
E eis-nos, em 2012, no meio de mais uma crise, nas mãos da "troika", vivendo do dinheiro emprestado pelo FMI e pelo BCE (emprestaram-nos umas costeletas mas querem um porco inteiro em troca...) e mais uma vez à espera do desejado, sempre na esperança de que alguém nos salve...

Quem será o  salvador deste povo?

Seremos nós próprios?


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* explicação relativa ao poema:
"Galaaz com pátria" - O Desejado, D.Sebastião que é equiparado a Sir Galahad, o cavaleiro virgem do Ciclo da Távola Redonda a quem foi dado conhecer o Santo Graal. A origem de Galahad era desconhecida (não tinha pátria) embora na verdade fosse filho de Sir Lancelot.
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Nota: Gostava de dedicar o vídeo acima à querida Ivani, do blog Samambaia, porque sei que ela vai gostar de ver essas belas imagens de Portugal, que ela tem no coração. :)

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Créditos: 

Agradecimentos:
 às organizadoras do evento:

RUTE, do blog Publicar para Partilhar

ROSÉLIA, do blog Espiritual-idade

e LUMA ROSA, do blog Luz de Luma, yes party! 



sexta-feira, 11 de maio de 2012

O Despertar do Irão - parte III

 

Bem, como já devem ter percebido, a minha vontade era transcrever para aqui o livro inteiro... ;)

como isso não é possível, tento salientar os pontos que me parecem mais relevantes, o que para mim chega a ser difícil, porque realmente o livro é todo ele muito interessante, recomendo-o sem hesitações. Depois do foco (nos posts anteriores) nos direitos das mulheres e das crianças, ou antes, na falta deles, agora, para terminar, o foco vai para um homem que tentou mudar o Irão, mas foi impedido.


Uma das coisas que aprendi com este livro (O despertar do Irão, Shirin Ebadi) foi que este país esteve à beira de se tornar bem diferente daquilo que continua afinal a ser hoje.  Na história recente do Irão já houve uma primavera, só que outros valores e interesses mais obscuros conseguiram levar a melhor.
É aqui que surge o nome de Mohammad Mossadegh, para mim um perfeito desconhecido até à leitura deste livro.
Claro que já tinha ouvido falar do Ayatollah Khomeini

assim como do Xá Reza Pahlavi

(que sempre ouvi pronunciar "palévi")

mas o nome de Mossadegh, um homem que foi tão importante para o Irão (e que poderia ter sido muito mais, se o tivessem deixado) era para mim desconhecido.

É por isso que vou ter que recuar  até 1951, ano em que Mossadegh, que desejava um Irão independente, livre e democrático,  foi nomeado primeiro-ministro.
Infelizmente para os iranianos esclarecidos e em especial para as iranianas, o seu tempo nesse cargo durou muito pouco tempo.
A 19 de Agosto de 1953, «uma voz trémula anunciava no rádio a pilhas que, após quatro dias de tumultos em Teerão, o primeiro-ministro Mohammad Mossadegh tinha sido derrubado num golpe de estado.»
Mohammad Mossadegh
E porquê?
«Os apoiantes do xá (imperador) que invadiram a estação nacional de rádio anunciaram que, com a queda de Mossadegh, o povo iraniano havia triunfado. (...) poucas pessoas partilhavam verdadeiramente deste sentimento. Para os iranianos laicos e para os religiosos, como para a classe trabalhadora e para a mais abastada, Mossadegh era muito mais do que um popular chefe de estado. Era um estimado herói nacional, uma figura digna de fervorosa veneração, um líder pronto para conduzir a sua grandiosa civilização com mais de 2500 anos de história.
Dois anos antes, em 1951, o primeiro-ministro tinha procedido à nacionalização da indústria petrolífera iraniana, até aí na realidade controlada por consórcios de petróleo do Ocidente, que extraíam e exportavam o petróleo iraniano em grandes quantidades e sob acordos que apenas atribuíam ao Irão uma ínfima parte dos lucros. Esta jogada audaciosa (...) garantiu a Mossadegh a adoração eterna dos iranianos, que o consideravam a figura de fundo da independência do Irão (...).
Perante a expansão do apoio popular ao primeiro-ministro, o xá teve de confrontar-se com a sua própria vulnerabilidade de monarca sem popularidade e apoiado apenas pelos seus generais, pelos Estados Unidos e pelo Reino Unido. As duas potências ocidentais estavam irritadas com o facto de Mossadegh ter nacionalizado a indústria petrolífera do Irão, mas esperavam o momento certo para ripostar. Em 1953, concluíram que estavam reunidas as condições para o derrubarem.
Kermit Roosevelt (neto de Theodore Roosevelt), chegou a Teerão para tranquilizar o assustadiço xá e para liderar o golpe de estado. (...)
No espaço de quatro dias, o adorado primeiro-ministro, agora derrotado, estava escondido numa cave, enquanto que o corrupto jovem xá era de novo investido de poder, agradecendo a Kermit Roosevelt numa frase que ficou célebre:
"Devo o meu trono a Deus, ao meu povo, ao meu exército, e a si."
Foi um momento profundamente humilhante para os iranianos, que assistiram à intervenção dos Estados Unidos na sua política interna, como se o seu país fosse uma espécie de fim de mundo que lhes pertencesse, sendo o seu líder escolhido ou deposto de acordo com os caprichos do presidente americano e dos conselheiros da CIA. »
Mossadegh sendo preso.
Mossadegh viria a ser acusado de traição (!). Segundo as suas próprias palavras, o seu maior pecado foi ter nacionalizado a indústria petrolífera iraniana. Foi esse "pecado" que nunca lhe perdoaram. Assim como ter querido acabar com o "sistema de exploração política e económica por parte do maior império mundial".

Durante o julgamento. Pelo ar fragilizado de Mossadegh e pelo ar dos que estão em pé, imagino o tipo de julgamento...
Toda a situação do Irão é muito complexa, e realmente, ao tomarmos conhecimento do que lá se passa, é fácil para nós criticarmos aquelas mentalidades. Mas o problema vai muito para além disso. Eles também têm que lutar contra a ingerência externa, com os grandes interesses internacionais. Hoje está provado que este golpe de estado que derrubou Mossadegh teve por trás grandes interesses económicos e políticos. Entre os responsáveis, além dos apoiantes do Xá, podemos também incluir a CIA e até a petrolífera BP... 
O que acho mais triste no meio de tudo isto é que um dos raros homens que teve a coragem de tentar mudar o Irão, acabou por ser condenado por traição, tendo passado 3 anos em prisão solitária, seguindo-se a prisão domiciliária até ao final da sua vida!!

Mossadegh morreu aos 85 anos, na sua terra natal, Ahmad Abad.
Para finalizar, uma nota que não sei se é trágica ou cómica: o juiz que o condenou chegou a anunciar a sentença de morte, mas foi dizendo que, como forma de tributo à superior misericórdia do Xá, iria reduzir a pena para três anos de prisão. Com um sistema político e judiciário corrompido a este nível, os iranianos ainda têm um longo caminho de luta pela frente.

"Estou consciente de que o meu destino servirá de exemplo no futuro, enquanto o Médio Oriente estiver a quebrar as correntes de escravatura e servidão aos interesses colonialistas." Mohammad Mossadegh

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Para quem gosta de aprofundar os temas (haverá mais "loucos" como eu??)deixo as sugestões:


Biografia de Mossadegh, em Inglês


quinta-feira, 10 de maio de 2012

O Despertar do Irão - parte II

O Despertar do Irão, Shirin Ebadi

Já todos sabemos que não é nada fácil ser mulher no Irão, que não é nada fácil ser criança, mas também não deve ser nada fácil ter filhAs e ver serem-lhes incutidos diariamente toda a espécie de valores, no mínimo, questionáveis. Não só deve ser difícil, como bastante duro.


«As minhas filhas estavam a crescer, ao ponto de, todos os dias, chegarem da escola com uma torrente de perguntas. Pum. Atiravam as mochilas para o chão no hall de entrada. Pum pum. Corriam pelo corredor fora, com os dedos pegajosos por causa de um petisco qualquer no caminho para casa. Viver na República Islâmica como mulher estava a tornar-se cada vez mais ardiloso, da mesma maneira que viver a maternidade da República Islâmica.

Mamã, é verdade que é errado eu aparecer à frente dos meus primos sem o véu? Mamã, é verdade que a América é a fonte de tudo o que é perigoso no mundo? Mamã, é verdade que Mossadegh* era um homem mau?

Tentar ensinar às minhas filhas valores progressistas e a vacuidade que estava detrás dos dogmas revolucionários que lhes eram ensinados na escola, ao mesmo tempo que me certificava de que elas aprendiam e, de qualquer modo, obedeciam superficialmente a todos os dogmas para que pudessem progredir no sistema educativo - tudo isto era um esforço de equilíbrio bastante precário. »

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*Mohammad Mossadegh foi primeiro-ministro no Irão, e lutou para que o país caminhasse no caminho da democracia e da tolerância. Desgraçadamente (embora previsivelmente) foi vítima de um golpe de estado. Mas isso fica para a "parte III". :)



Sempre firme! :)

Um dos campos em que Shirin Ebadi desempenhou um papel importantíssimo foi na defesa dos direitos das crianças. Segue um excerto que penso ser bem elucidativo de certos absurdos praticados no Irão, como o facto de as crianças, passada a 1ª infância, em caso de separação dos pais, serem sempre entregues ao pai, sejam quais forem as circunstâncias...

«Numa manhã do Verão de 1997, enquanto folheava um jornal no meu escritório, deparei-me com a história de uma criança espancada que, após ter sido sujeita a repetidas pancadas na cabeça, morrera num hospital local. A fotografia que acompanhava a notícia mostrava uma pequena menina curvada cujos magros membros estavam cobertos de queimaduras de cigarro. Era de tal maneira pesaroso olhar para aquela fotografia, que virei rapidamente a página e continuei a ler. A menina chamava-se Arian Golshani. Depois do divórcio dos pais, o tribunal atribuiu a guarda de Arian ao pai, um homem violento e com cadastro por fraude e dependência de estupefacientes. Segundo os vizinhos, o pai mantinha Arian encarcerada. A menina de nove anos pesava apenas cerca de dezasseis quilos, os braços tinham-lhe sido partidos várias vezes e engessados com moldes improvisados e, quando a professora chamou o pai para o questionar acerca das marcas de queimaduras de cigarro que ela tinha por todo o corpo, ela foi mantida em casa, longe da escola, durante meses. A mãe de Arian foi a tribunal e pediu a sua custódia – explicou as condições em que se encontrava a sua filha, explicou que o seu ex-marido era culpado de maus-tratos horrendos. Impassível, o tribunal recusou conceder-lhe a custódia. » (...)

Na sequência desde caso, a autora levou a cabo campanhas de divulgação e acções de protesto, com o intuito de que casos como este não se voltassem a repetir. Neste país, é "malhar em ferro frio", mas também "água mole em pedra dura"... ficar parados é que eles não podem.
«A Revolução Islâmica consagrara a família muçulmana como a peça fundamental da ideologia daquilo que deveria ser uma nação. Os revolucionários dirigiam a sua atenção para a mãe muçulmana, domesticada, confinada ao lar e preocupada com a sua prole em crescimento, logo, a chave para o restabelecimento dos valores tradicionais e autênticos. Contudo, não lhes parecia então de todo contraditório promulgar uma legislação para a família que, na eventualidade de divórcio, automaticamente arrancava as crianças das suas mães, ou que tornava a poligamia tão conveniente quanto uma espécie de garantia de recurso. A questão da guarda de crianças tinha tido um peso considerável ao longo dos anos na minha cabeça, já que a minha irmã mais velha mantivera durante muito tempo o seu casamento falhado por causa do medo de perder os filhos. Era uma questão que se enquadrava entre as leis e artigos mais destrutivos do sistema jurídico e o protesto público contra a lei da guarda de crianças aumentava de intensidade a cada ano que passava. » (…)


Interessante: Autobiografia de Shirin Ebadi, (em inglês) no site oficial do Prémio Nobel




quarta-feira, 9 de maio de 2012

O Despertar do Irão, de Shirin Ebadi

O Despertar do Irão é um livro de memórias de Shirin Ebadi, activista dos direitos humanos galardoada com o Nobel da Paz em 2003.

Li o livro recentemente e gostei bastante. Fiquei a conhecer em detalhe a história recente do Irão, e muitas situações que não eram claras para mim passaram agora a fazer mais sentido. Outras continuam a não fazer sentido nenhum...

Há tempos atrás, manifestei a minha opinião contra o facto de em França ter sido proibido o uso do véu islâmico, por considerar que as mulheres que o queriam usar tinham direito a fazê-lo. Agora, com toda a sinceridade, depois de conhecer melhor a história do Irão e perceber que o véu pouco ou nada mais simboliza do que a opressão da mulher ao longo dos séculos, terei que reconsiderar... As mulheres que insistem em usá-lo, e sobretudo as que andam totalmente cobertas, inclusive o rosto, saberão realmente o verdadeiro significado de tudo aquilo?

Shirin Ebadi

Shirin Ebadi nasceu em 1947  e desde cedo teve um papel importantíssimo na luta pelos direitos humanos, em particular depois da implementação do regime dos ayatollahs.
Muito há a dizer acerca deste livro. Iniciei um post, mas estava a ficar com dimensões "ilegíveis", de modo que decidi separá-lo por temas.
Hoje vou deixar aqui excertos do livro que têm a ver com a situação das mulheres no Irão.
A defesa dos direitos das mulheres tem sido uma luta constante para Shirin.



Segue a descrição de uma situação no mínimo caricata, ilustrativa da importância dada às mulheres, em pleno Parlamento iraniano:
«Depois do chá, recolhemos ao aposento privado das mulheres para conversar. Quando estávamos a chegar ao fundo do corredor, o primeiro sinal de alarme foi o facto de o aposento não ter efectivamente porta, mas apenas uma cortina. Entrámos para uma sala vazia cujo pavimento estava coberto por um tapete feito à máquina. Eu continuava a procurar uma outra porta que desse para a sala onde elas realmente se sentavam para trabalhar. Mas todas pousaram as suas coisas no chão e todas se sentaram no tapete, de pernas cruzadas. “Por que é que não há cadeiras?”, perguntei. “Por que é que nem sequer existe aqui uma máquina de fotocópias? Isto é o parlamento!” “Bem, nós já pedimos imensas vezes uma máquina de fotocópias”, disse uma das deputadas, “mas disseram-nos que somos muito poucas para justificar termos o nosso próprio equipamento de escritório. Temos autorização para usar os gabinetes dos homens, claro, mas preferimos estar aqui, porque geralmente está muito calor e, pelo menos aqui, podemos despir o chador e respirar um pouco.”»
«Ali mesmo, naquele sítio e àquela hora, o meu coração despedaçou-se um pouco. Ali estávamos nós no parlamento, dentro das próprias paredes onde se supunha que estas mulheres estivessem a legislar e a mudar as condições de milhões e milhões de mulheres lá fora, e elas nem sequer conseguiam garantir uma mesa para si próprias. O que é que se consegue alcançar na sociedade em geral, quando isto é tudo o que se conseguiu dentro da própria instituição? »


Em relação à imposição do uso do lenço (ou véu)


A mãe da autora, nascida nos anos 20, nunca usou o lenço.

«O “convite” ao uso do lenço na cabeça foi o primeiro sinal de que esta revolução (1979) poderia vir a engolir as suas irmãs, que era como as mulheres se chamavam umas às outras enquanto faziam campanha para derrubar o Xá. Imaginem o cenário, poucos dias após a vitória da revolução. Um homem chamado Fathollah Bani-Sadr foi nomeado para procurador provisório do Ministério da Justiça. Ainda inchados de orgulho, alguns de nós escolheram uma tarde límpida e fresca para descer até ao seu gabinete e para o congratular. Ocupámos todo o aposento e trocaram-se muitas saudações afectuosas e felicitações rebuscadas. Até que o olhar de Bani-Sadr se deteve em mim. Esperava que ele me agradecesse ou que exprimisse o quanto significava para ele o facto de uma empenhada juíza e mulher, como eu, ter permanecido ao lado da revolução. »

«Em vez disso, ele disse: “Não acha que, por respeito ao nosso adorado Imã Khomeini, que agraciou o Irão com o seu regresso seria melhor que você cobrisse os seus cabelos?” Fiquei abalada. Ali estávamos nós, no Ministério da Justiça, depois de uma imensa revolta popular ter substituído a antiga monarquia por uma república moderna, e o novo procurador da justiça estava a falar sobre cabelo. Cabelo!





Em toda a minha vida, nunca usei lenço na cabeça”, disse eu,“e seria uma hipocrisia começar a fazê-lo agora.
“Então, não seja hipócrita e use-o com fé!”, disse ele, como se tivesse acabado de resolver o meu dilema.
“Oiça, não seja tão engenhoso”, respondi. “Eu não deveria ser forçada a usar véu e, se não acredito nele, simplesmente não vou usá-lo.”
“Mas não vê como é que as circunstâncias se estão a desenvolver?” perguntou ele, levantando a voz.
“Sim, mas não quero fingir ser uma coisa que não sou”, disse eu, abandonando a sala.
Eu não queria ouvir, ou sequer pensar, no tipo de realidade que “as circunstâncias” reservavam para nós. »
E Shirin acabou por ter de o usar, de outro modo corria o sério risco de ser presa por esse motivo.
Fotografia para o passaporte, já com o uso do véu sendo obrigatório.

O seguinte excerto tem a ver com o preconceito em relação a mulheres instruídas e/ou ocupando cargos de relevo:

«Ainda que o Irão fosse dirigido por um governo secular, ainda que eu fosse uma juíza, mulher, com assento próprio e uma carreira promissora diante de mim, a cultura iraniana continuava a ser dominada por um sistema patriarcal, o que significava que todos os meus pretendentes se afastavam. Felizmente, eu não dava muita importância à ideia de que ser juíza era um dramático entrave às minhas perspectivas matrimoniais. Os livros e as teorias de Direito interessavam-me mais do que a fixação num lugar ou o design de interiores, e o trabalho completava tão intensamente a minha vida, que eu não sentia o enorme e doloroso vazio que apenas um marido pode preencher.
Contudo, não me era indiferente o facto de que, sendo de boas famílias, tendo uma aparência atraente e um emprego respeitável, eu não tinha muitos pretendentes. Conclusão: a minha carreira enchia de medo o coração dos homens iranianos. No momento em que se imaginavam a casar comigo, imaginavam-se também numa contenda matrimonial com uma juíza - e acreditavam, suponho, que não poderiam limitar-se a dizer "Porque eu disse que era assim" e bater com a porta - e fugiam na direcção oposta. Descobri ainda que isto se aplicava tanto aos homens iranianos instruídos e supostamente modernos, como aos conservadores - preferiam, simplesmente, ser superiores e mais importantes do que a mulher com quem casavam. E claro que uma mulher independente, com objectivos próprios, estaria menos disponível para os amar cegamente e para os servir em todas as ocasiões. (...)
Uma noite, na festa de um amigo, um jovem senhor andou à minha volta durante metade da noite, até convencer o anfitrião a apresentar-nos. (...)
 «Ficou combinado que iríamos encontrar-nos, na semana seguinte, numa outra festa. Disse-me que estava apaixonado e que se o seu sentimento fosse recíproco, pediria imediatamente a minha mão em casamento. (...) No fatídico dia da tal festa, e antes de me vir cumprimentar (...) foi ter com o anfitrião, dizendo que se soubesse que eu era juíza, nunca teria insistido em encontrar-se comigo novamente. »


«A Nobel da Paz iraniana (...)  reconhece que, enquanto mulher no Irão, continua a sentir-se na pele de "um negro na altura do apartheid". "Infelizmente, enquanto tivermos leis discriminatórias sentir-me-ei assim, tal como todas as mulheres do meu país".»

Link para uma entrevista dada por Shirin Ebadi em Lisboa, em 2009, a propósito de outro seu livro mais recente, «A Gaiola de Ouro», entrevista da qual faz parte o excerto acima.

sexta-feira, 4 de maio de 2012

O túmulo de D. Pedro I


Tinha prometido nesta postagem, na qual mostrei o túmulo de D. Inês de Castro, que falaria mais tarde do túmulo de D. Pedro I.
Aqui está ele:

Túmulo de D. Pedro I, no Mosteiro de Alcobaça
Além de, na minha opinião, tanto este túmulo como o de Inês de Castro serem exemplares belíssimos da escultura gótica, resolvi chamar a atenção para ele precisamente por causa do que está representado nos riquíssimos pormenores da escultura, nomeadamente na Roda da Vida e na Roda da Fortuna, mostradas mais abaixo. A mim impressiona-me imenso esta riqueza de pormenores, e não posso deixar de imaginar o trabalho imenso que terá sido realizar estas obras.

Túmulo de D. Pedro I - pormenor

«D. Pedro I está representado também com a expressão tranquila, coroado e rodeado por anjos. Segura o punho da espada na mão direita, enquanto com a esquerda agarra a bainha.
Nas faces do túmulo estão representadas: nos frontais, a Infância de S. Bartolomeu e o Martírio de S. Bartolomeu e, nos faciais, a Roda da Vida e a Roda da Fortuna e ainda a Boa Morte de D. Pedro.

Neste túmulo destaca-se o facial da cabeceira onde está representada a Roda da Vida e a Roda da Fortuna.


«A Roda da Vida possui 12 edículas com os momentos da vida amorosa e trágica de D. Pedro e de D. Inês. Na leitura das edículas (feita no sentido ascendente e da esquerda para a direita), podemos observar:
  • 1 D. Inês acaricia um dos filhos;
  • 2 O casal convive com os três filhos;
  • 3 D. Inês e D. Pedro jogam xadrez;
  • 4 Os dois amantes mostram-se em terno convívio;
  • 5 D. Inês subjuga uma figura prostrada no chão;
  • 6 D. Pedro sentado num grandioso trono;
  • 7 D. Inês apanhada de surpresa pelos assassinos enviados pelo rei D. Afonso IV;
  • 8 D. Inês desmascarando um dos seus assassinos;
  • 9 Degolação de D. Inês;
  • 10 D. Inês já morta;
  • 11 Castigo dos assassinos de Inês;
  • 12 D. Pedro I envolto numa mortalha.
Nas edículas interiores – Roda da Fortuna – podemos observar (no mesmo sentido da Roda da Vida):
  • I D. Inês sentada à esquerda de D. Pedro (por ainda não estarem casados);
  • II O casal troca de posição (D. Inês sentada à direita de D. Pedro, o que indica que já estão casados);
  • III D. Pedro e D. Inês sentados lado a lado parecendo um retrato oficial;
  • IV D. Afonso IV a expulsar (por apontar do dedo) Inês do reino;
  • V D. Inês repele um homem que parece ser de novo D. Afonso IV;
  • VI D. Pedro e D. Inês prostrados no chão subjugados pela figura híbrida da Fortuna que segura com as mãos a roda.»
Fonte: Wikipédia


Como já foi dito, os túmulos encontram-se no Mosteiro de Alcobaça (link para o site do Mosteiro de Alcobaça) , monumento que, pela sua beleza e grandiosidade, também merece destaque.
    
    Mosteiro de Alcobaça

Mosteiro de Alcobaça - Ou Abadia de Santa Maria de Alcobaça é igualmente Património Mundial. Foi fundado em 1178 pela Ordem de Císter. Implantado no vale fértil dos rios Alcoa e Baça, no seguimento de um voto de doação à Ordem de Císter feito por D. Afonso Henriques aquando da conquista de Santarém aos Mouros...

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Localização de Alcobaça no mapa de Portugal
    Não deixe de visitar!

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Vergonha alheia



Ainda não estamos em guerra civil...
Ontem não se verificou em Portugal nenhuma catástrofe natural...
Mas houve prateleiras de supermercado completamente esvaziadas, houve empurrões e até pancadaria...
E "por acaso" ontem era  Dia do Trabalhador, os supermercados e hipermercados deviam estar encerrados...

MAS...

Aconselho em particular a reportagem TVI, aos 5m49s

Pingo Doce deve ser penalizado se violou concorrência - Portugal - DN

«A ASAE (Autoridade para a Segurança Alimentar e Económica) vai averiguar se os supermercados Pingo Doce cometeram alguma ilegalidade. Em causa está um desconto de 50% nas compras superiores a 100 euros. Já o sindicato do comércio admite apresentar queixa à Autoridade da Concorrência.
Fonte da ASAE disse, à agência Lusa, que nesta altura já está a recolher documentação para determinar se existiram, ou não, infrações na campanha lançada na terça-feira pela Jerónimo Martins nos seus supermercados.
Isto porque ontem os comerciantes acusaram o Pingo Doce de vender produtos abaixo do preço de custo. A Autoridade para a Segurança Alimentar e Económica (ASAE) promete atuar caso haja algum indício de praticas ilícitas.
O Bloco de Esquerda já pediu a intervenção com «celeridade» da autoridade da concorrência. O bloco entende que o grupo do Pingo Doce teve uma «atitude provocatória contra os direitos dos trabalhadores».
Também o PCP denuncia que as cadeias de super e hipermercados violaram os acordos coletivos de trabalho do setor ao «obrigarem» os funcionários a trabalhar no 1º de maio e querem ouvir o ministro da Economia e do Emprego sobre o caso Pingo Doce, onde se suspeita da prática de dumping.


Já a CGTP desafiou o Governo a enfrentar Soares dos Santos.

A promoção de ontem causou o caos, com dezenas de milhares de pessoas a tentar aproveitar a promoção.

Os parques de estacionamento encheram logo antes da abertura das portas. Em algumas lojas, a polícia teve mesmo de intervir por causa de desacatos entre clientes.

A afluência foi tal que algumas lojas tiveram de fechar para repor as prateleiras e voltar a abrir para atender os clientes que se juntavam à entrada.

Os stocks esgotaram e o número massiço de aderentes aliado ao desespero por conseguir comprar levou a alguns desacatos que obrigaram à intervenção da polícia. »


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Este assunto provoca-me duas reacções: uma é dizer apenas: QUE VERGONHA!
A outra é dizer e/ou perguntar várias coisas. E tenho que dizer, não me consigo calar. Ficam aqui apenas algumas questões que me coloco, falando com os meus botões...


1. É a primeira vez, desde o 25 de Abril de 1974, que os "patrões" dos super e hipermercados se atrevem a forçar os seus funcionários a trabalhar no 1º de Maio. E porquê? Porque têm as costas muito bem protegidas pelo governo.


2. Se o Pingo Doce ontem vendeu todos os produtos a metade do preço, porque não pratica esses preços no dia-a-dia? Se ontem teve lucros, porque não adopta esses preços sempre?


3. Onde terão ido parar os "heróis do mar, nação valente e imortal"? Quase não sobraram vestígios desse "nobre povo".


4. O que se veria em Portugal, numa situação de catástrofe? Se ontem foi o que se viu, pessoas a esmagarem-se e à pancada para fazer compras com 50% de desconto, o que seria em caso de um terramoto, ou coisa que o valha? DEUS NOS LIVRE!!


5. Será impressão minha, ou a esta hora grande parte daqueles produtos comprados com tamanha sofreguidão já estarão em caixotes do lixo? Produtos congelados, iogurtes e outros que tais, terão resistido a CINCO ou SEIS horas na fila do supermercado??


6. Eu estou pasma até agora, com a brutalidade de toda aquela situação. E o pior é que não me parece, de todo, que a crise seja uma justificação para o que aconteceu. Não me parece, de maneira nenhuma, pelas imagens que passaram nas televisões, que grande parte daquela gente esteja a passar necessidades. Aquilo foi sofreguidão pura e dura, foi gosmice, avidez, açambarcamento, foi querer apanhar este mundo e o outro, eu sei lá o que aquilo foi, foi uma total falta de civismo, só justificável em situações de hecatombe.


E muitas coisas haveria ainda a dizer, mas enfim, cada um que tire as suas conclusões. Só me resta repetir o que se ouve por aí: AO QUE ISTO CHEGOU!