terça-feira, 14 de julho de 2009

Comércio Justo?

Quando fiz este fondant de chocolate para o Dia Castanho, comprometi-me a fazer um post sobre o Comércio Justo.


Demorou um bocadinho, até porque tenho andado com uma certa falta de alento (será falta de chocolate?) mas, como diria a Cenourita, mais vale tarde do que muito tarde... :)


Como se pode ver aqui em baixo (pode clicar na imagem para ampliar), este preparado é um produto do chamado Comércio Justo, ou Equitativo.
Este conceito, pelo menos teoricamente, é muito bom, pois a ideia é que os pequenos produtores de países sub-desenvolvidos ou em vias de desenvolvimento recebam o justo valor pelos produtos que cultivam. Mas parece que a coisa não é assim tão linear e, como quase sempre, haverá já outros interesses por detrás desta suposta justiça.


Há muita informação sobre este assunto disponível na net (muita, mesmo!), e como não sou especialista no assunto, resolvi colocar aqui um texto retirado da Wikipédia, onde é definido este tipo de comércio:

«Comércio justo (Fair Trade em inglês) é um dos pilares da sustentabilidade económica e ecológica .

Trata-se de um movimento social e uma modalidade de comércio internacional que busca o estabelecimento de preços justos, bem como de padrões sociais e ambientais equilibrados, nas cadeias produtivas.




Filme animado sobre o comércio justo. Adorei a música.

A ideia de um comércio justo surgiu nos anos 1960 e ganhou corpo em 1967, quando foi criada, na Holanda, a Fair Trade Organisatie. Dois anos depois, foi inaugurada a primeira loja de comércio justo. O café foi o primeiro produto a seguir o padrão de certificação desse tipo de comércio, em 1988. A experiência se espalhou pela Europa e, no ano seguinte, foi criada a International Fair Trade Association, que reúne atualmente cerca de 300 organizações em 60 países.

O movimento dá especial atenção às exportações de países em desenvolvimento para países desenvolvidos, como artesanato e produtos agrícolas. Em poucas palavras, é o comércio onde o produtor recebe remuneração justa por seu trabalho.


Alguns países têm consumidores preocupados com a sustentabilidade e que optam por comprar produtos vendidos através do comércio justo. Esta opção ética tem permitido aos pequenos produtores de países tropicais viver de forma digna ao fazeram a opção pela agroecologia, como agricultura orgânica.

O comércio justo é definido pela News! (a rede européia de lojas de comércio justo) como "uma parceria entre produtores e consumidores que trabalham para ultrapassar as dificuldades enfrentadas pelos primeiros, para aumentar seu acesso ao mercado e para promover o processo de desenvolvimento sustentável. O comércio justo procura criar os meios e oportunidades para melhorar as condições de vida e de trabalho dos produtores, especialmente os pequenos produtores desfavorecidos. Sua missão é promover a equidade social, a protecção do ambiente e a segurança económica através do comércio e da promoção de campanhas de consciencialização».

Princípios

Todos as organizações envolvidas no circuito do Comércio Justo devem obedecer aos seguintes princípios:

Produtos de comércio justo e solidário: artesanato africano (instrumentos musicais, cerâmica e chás)
  • A preocupação e o respeito pelas pessoas e pelo ambiente, colocando as pessoas acima do comerciante;
  • A criação de meios e oportunidades para os produtores melhorarem as suas condições de vida e de trabalho, incluindo o pagamento de um preço justo (um preço que cubra os custos de um rendimento aceitável, da protecção ambiental e da segurança económica);
  • Abertura e transparência quanto à estrutura das organizações e todos os aspectos da sua actividade, e informação mútua, entre todos os intervenientes na cadeia comercial, sobre os seus produtos e métodos de comercialização;
  • Envolvimento dos produtores, voluntários e empregados nas tomadas de decisão que os afectam;
  • A protecção dos direitos humanos, nomeadamente os das mulheres, das crianças e dos povos indígenas;
  • A consciencialização para a situação das mulheres e dos homens, enquanto produtores e comerciantes, e a promoção da igualdade de oportunidades;
  • A promoção da sustentabilidade através do estabelecimento de relações comerciais estáveis de longo prazo;
  • A educação e a participação em campanhas de sensibilização;
  • A produção tão completa quanto possível dos produtos comercializados no país de origem.»
É claro que, ao lermos isto, o comércio justo nos parece praticamente perfeito e cheio de boas intenções! Mas...

Entretanto, há opiniões discordantes que põem em causa a justeza deste comércio. Encontrei o seguinte artigo no Le Monde Diplomatique (do qual coloco alguns excertos e o link), que fala precisamente dos "prós e contras" do comércio justo.

«Max Havelaar ou as ambiguidades do comércio justo»

por Christian Jacquiau

A marca Max Havelaar, líder mundial do comércio justo, procura responder a uma procura de consumo «diferente», assente na solidariedade entre consumidores do Norte e pequenos produtores do Sul. A empresa parece contudo estar a operar uma viragem «pragmática», ligando-se a grandes grupos muito distantes das suas preocupações originais. Não é certo que os produtores e os cidadãos se revejam nessa viragem.

Como contribuir para que os pequenos camponeses pobres tenham um rendimento que lhes permita assumir as suas necessidades fundamentais e estabelecer relações humanas com base em valores diferentes dos preconizados pelo «liberalismo total» planetário? Foi em 1964, na primeira Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento, que a ideia «Trade Not Aid!» (Comércio, não auxílio) deu origem ao comércio justo. Até então reservada a uma clientela de iniciados, a velha ideia duma relação mais justa entre o Norte e o Sul popularizou-se junto de um público facilmente classificado como «alterconsumidor».

«Criado como comércio solidário», lembra a socióloga Virginie Diaz Pedregal, «o comércio justo foi no início muito influenciado pelo humanismo dos movimentos religiosos cristãos, bem como por uma concepção protestante da ética». De essência caritativa, mas ulteriormente influenciado por uma abordagem política mais terceiro-mundista, este comércio solidário transformou-se em acto de oposição ao sistema capitalista, tornando-se então «alternativo».

(...)

No presente estado de coisas, não há nenhum «produto certificado» nem nenhuma regulamentação que dêem garantias oficiais aos consumidores do comércio justo, que têm de se ficar pela confiança que possam depositar nos agentes do sector. Com efeito, a expressão «produto certificado» só pode ser utilizada se corresponder a uma tripla exigência: ter um caderno de encargos submetido a fiscalizações independentes, ser certificado por um organismo também ele independente e reconhecido pelos poderes públicos.

Os grandes beneficiários da presente engenharia são acima de tudo as estruturas de auditoria e os intermediários da certificação, juntamente com as transnacionais do agro-alimentar, da torrefacção e da distribuição. A estas últimas o comércio equitativo não custa nada, visto limitarem-se a pagar um pouco mais caro por uma quantidade ínfima de matérias-primas, com fama de equitativas, que de imediato sobrefacturam a consumidores em busca de equidade. Não havendo uma regulamentação que defina essas matérias-primas e codifique o seu conteúdo, a debilidade das fiscalizações que garantem o comércio equitativo presta-se também a toda a espécie de controvérsias. A Direcção-Geral da Concorrência (...) detectou a inexistência de um caderno de encargos ou até de informações relativas à origem e percurso dos produtos.»

Como já disse, não sou entendida no assunto. Quando soube da existência deste comércio, achei o objectivo bastante interessante. Na altura só lamentei que os produtos fossem mais caros do que os "tradicionais", alguns bastante mais caros.

Entretanto, fui ouvindo outras opiniões, e não há nada como tentar conhecer sempre o reverso da medalha, para podermos decidir em consciência.


Já agora, quero pedir à Cláudia, se ela passar por aqui, para dar a sua opinião de expert.

Eu sei que ela defende não o Comércio Justo, mas a «Trade Justice» (Justiça comercial?). Tentei investigar esta forma de comércio, mas não encontrei quase nada em português. É por isso que lhe peço que venha aqui a terreiro trazer alguns esclarecimentos. Pode ser, Claudinha? :)

Recomendo ainda a leitura do texto publicado no blog do Dr. Fernando Nobre, cujo trabalho e qualidades pessoais admiro imensamente. Espero viver o suficiente para lhe ver atribuído o Prémio Nobel da Paz, de que ele na minha opinião é um dos maiores merecedores, pelo trabalho imenso e importantíssimo que tem desenvolvido um pouco por todos os cantos do Mundo onde há necessidade de ajuda médica e/ou humanitária.

Também há informação interessante aqui, especialmente para os alfacinhas... :)


Em relação ao meu fondant, quanto à qualidade, achei muito bom. Agora espero sinceramente é que a minha compra tenha de algum modo contribuído para a justeza do comércio internacional. Será?


(Mas afinal isto é um post ou uma tese???)



12 comentários:

ameixa seca disse...

O teu post é uma espécie de dissertação e ainda bem. Pelo menos dá para avisar acerca do comércio justo. É bom conhecer os dois lados da medalha...
Como sempre, nada é perfeito e, muitas vezes, é só conto do vigário. Espero sinceramente que exista mesmo um comércio justo e não falo só nos países sub-desenvolvidos. Na Europa, aqui mesmo, há muito trabalhador que merece muita mais justiça, tanto no pagamento como no tratamento que recebe das entidades patronais.
As fotos dos teus miúdos estão o máximo :)

Carolina Andrade disse...

É, comércio justo é coisa que por aqui não existe, pelo menos ainda. Ainda bem que pessoas do bem se preocupam com isso. Belo fondan Beijos

Anónimo disse...

Bem, a sotôra aplicou-se! Já tinham alguns lamirés sobre o assunto, mas gostei dos pormenores...
Por norma não sou pessimista, mas no que respeita a este assunto, penso que muita água há-de correr até haver a justiça aclamada, isto porque hão-de existir sempre os intermediários oportunistas!
E porque, justiça numa sociedade tão injusta, cheira-me a utopia...
Da minha parte, defendo e aplaudo o conceito! :)

Noémia disse...

Minha querida, muito bem dito e analisado.
Na verdade há sempre bons princípios a nortearem grandes ideias, o pior é que o ser humano é imperfeito e há sempre um " caramelo" qualquer que tem que lixar tudo!
Há tanta coisa que o Norte podia fazer pelo Sul, em tantos aspectos...e tantas coisas que deveriamos reaprender ou relembrar com o Sul!
Estes assuntos deixam-me sempre um travozinho de tristeza e impotência, a vocês não?

Marcia disse...

Acho que é um post-tese ou uma tese em forma de post. Muito bom!
Continue e continuarei lendo suas teses ou posts.

Isabel disse...

Aí está um ótimo tema para uma tese! Gostei muito de ler este teu post, levanta questões muito interessantes. Quer dizer então que as empresas aproveitam-se da boa vontade do consumidor europeu e sobrevalorizam um produto que não é tão bom assim, e quem fica com o lucro acaba por ser o comerciante e não o produtor, como sempre!
É muito bom estar informada sobre estes assuntos, para podermos tomar decisões conscientes como consumidores.
Bjs

Ana Luisa Coelho disse...

Oi Claudia

Por aqui ainda não vejo ccomentar sobre comércio justo não!!!
O que se comenta muito é sobre produtos ecologicamente corretos ou orgânicos.
e como vc disse, as vezes tudo tão mais caro, que infelizmente ficamos com o tadicional.
Meu avô materno era agricultor e plantava cebolas..cresci escutando sobre o preço da venda da cebolas, se devia guardá-las mais um pouco, ou vendê-las logo? o drama do melho negócio para o pequenino agricultor.


bjus
ana maria

Ana Maria ( Jeito de Casa ) disse...

oi Claudia
Voltando pra pedir desculpas, pois a conta estava em outro nome e não tinha percebido...

bjus
ana maria

Cláudia Marques disse...

Ana Maria, pensei que o blogger tinha enlouquecido de vez... :)

Mais logo eu volto, agora vou sair a correr, que já estou + que atrasada!

Abóbora Amarelinha disse...

chiiiiii! fui!

Claudia disse...

Claudinha,

Primeiro vou desabafar: as pessoas são tão alienadas da realidade do comércio internacional que me dá vontade de chorar de raiva. Fico feliz com tua postagem. Necessária.

Mas eu combato o Fair trade, é esmola, não faz diferença alguma, não altera em nada a estrutura do comércio internacional de commodities.

Eu defendo a Trade Justice, a reformulação das regras do comércio internacional e, acima de tudo, o fim dos subsidíos agrícolas nos países desenvolvidos.

O tal comércio justo são umas meia dúzia de sacas de cacau, café e algum açúcar compradas sob inspeção de empresa européia e processados por empresas alimentícias européias. O tal comércio justo não é tão justo assim. Afinal é justo para quem? De acordo com quem?

A situação é difícil, desesperante eu diria.

Claudia

ANA COSTA E EDITE ISABEL disse...

Boa Tarde.
Antes de mais parabéns pelo empenho nesta nobre causa.
quero perguntar como é possivel importar materias,estatuas,roupas de paises africanos com vista a revender em fu´tura loja.está a ser muito complicado encontar forma de o conseguir portanto agradeço a ajuda possivel.se puder responda para o mail
ananuno13@hotmail.com.Muito obrigado e mais uma vez parabéns :)