sábado, 14 de julho de 2018

Faz hoje dez anos, escrevia eu aqui sobre um dos meus livros preferidos de sempre, "As Pontes de Madison County", escrito por Robert James Waller. 

Tratava-se de um desafio inserido no projecto "Academia dos Livros", e consistia em lançar uma citação do livro para ver "quem chegava lá"... No entanto, após a dificuldade em escolher apenas uma citação, decidi contar a história através de várias citações. 

Vou retomar essa publicação, até porque o livro continua a significar para mim o mesmo dessa altura, e será sempre um dos meus eleitos. Vale muito a pena ler e deixar-se levar pela magia. 

Era uma vez uma mulher de 45 anos, casada com um fazendeiro, com dois filhos já crescidos, que vivia uma vida (demasiado) pacata, algures nos campos do Iowa. Chamava-se Francesca.

Era uma vez um homem de 52 anos, fotógrafo, divorciado, um homem que já correra meio mundo em busca de belos lugares para fotografar. Chamava-se Robert e era o mais solitário que se podia ser.

Um belo dia, ao serviço da National Geographic, Robert Kincaid... 

virou para a Estrada Nacional 65, atravessou Des Moines cedo numa segunda-feira de manhã, no dia 16 de Agosto de 1965, virou para oeste na estrada 92 de Iowa, e dirigiu-se para Madison County e para as pontes cobertas que lá deviam estar (...) 

Encontrou facilmente as seis primeiras e foi planeando a sua estratégia para as fotografar. Mas não conseguia encontrar a sétima num lugar chamado Roseman Bridge. Estava calor, Robert estava com calor, Harry - a sua carrinha - estava quente, e andava às voltas por estradas de gravilha que pareciam não levar a lado nenhum (...). 

Em sítios desconhecidos, a sua regra de ouro era "perguntar três vezes". (...) Talvez aqui duas fossem suficientes. 

Aproximava-se de uma caixa de correio, que se avistava no final de um caminho com cerca de cem metros (...). Abrandou e entrou no caminho em busca de orientação. 

Quando entrou no pátio, viu uma mulher sentada no alpendre. O sítio parecia fresco, e a mulher estava a beber algo que parecia ainda mais fresco. Levantou-se e veio ao seu encontro. Robert desceu da carrinha e olhou para ela, depois olhou melhor, e melhor ainda. Era linda, ou tinha sido algum dia, ou poderia vir a ser de novo. E ele sentiu imediatamente a velha falta de jeito que sempre o afectava na presença de mulheres pelas quais se sentia atraído, ainda que fosse um sentimento vago. 

"(...) estou à procura de uma ponta coberta, por estas bandas, e não consigo encontrá-la."

Olhou directamente para ela, e ela sentiu um sobressalto interior. Os olhos, a voz, a cara, o cabelo cor-de-prata, a maneira desenvolta de andar, velhas sensações, sensações perturbadoras, irresistíveis. Sensações que sussurram ao ouvido no último momento antes de o sono chegar, quando caíram todas as barreiras. (...)

"Está bastante próximo. A ponte fica a cerca de três quilómetros daqui." Então, após vinte anos de uma vida fechada, uma vida de comportamentos impostos e sentimentos dissimulados, exigidos por uma cultura rural, Francesca Johnson surpreendeu-se a si mesma ao dizer:

"Terei muito prazer em lha mostrar, se quiser." 

Nunca soube muito bem porque o fez. Eram os sentimentos de uma jovem que brotavam como uma bolha na água e rebentavam, talvez, após todos aqueles anos. Ela não era tímida, mas também não era ousada. A única coisa que sabia era que Robert Kincaid a tinha atraído, depois de ter olhado para ele durante apenas alguns segundos.

Foi esta atitude espontânea de Francesca que despoletou todos os acontecimentos que se seguiram. Foi como se ela, no fundo, estivesse há anos à espera de uma oportunidade de quebrar a rotina e monotonia da sua vida. Tudo aconteceu com uma enorme naturalidade. Ela mostrou-lhe onde ficava a ponte, ele observou o local e decidiu voltar numa madrugada próxima, para aproveitar essa luz. De regresso a casa, ela convidou-o para tomar um chá gelado. Conversaram bastante e, sempre naturalmente, ele acabou por ficar para jantar (Francesca estava sozinha, o marido e os filhos estavam fora, numa feira de gado...).


Deu uma das garrafas a Francesca e ergueu a sua numa espécie de brinde.
«Às pontes cobertas ao entardecer ou, melhor ainda, em manhãs quentes, cor-de-fogo.» Sorriu. 

Francesca não disse nada, mas sorriu suavemente e levantou um pouco a sua garrafa, com um gesto hesitante e desajeitado. Um estranho desconhecido, as flores, o perfume, a cerveja e um brinde numa quente segunda-feira de um fim de Verão. Era mais do que conseguia aguentar. 
(...) 


Mais tarde, já depois de ele se ter ido embora e se ter despedido... 

... sentou-se à mesa da cozinha a escrever em meia folha de papel vulgar. Jack (o cão) seguiu-a até à carrinha Ford e saltou para dentro quando ela abriu a porta. (...) 



Roseman Bridge estava às escuras. Mas Jack correu à frente, para garantir que estava tudo bem, enquanto Francesca tirava uma lanterna da carrinha. Colou o bilhete no lado esquerdo da entrada da ponte e voltou para casa.

Mais uma vez, Francesca toma uma atitude decisiva para o desenrolar dos acontecimentos. Se ela não tivesse cedido a este impulso, provavelmente ela e Robert não teriam voltado a ver-se.
O bilhete, descoberto por ele na manhã seguinte, enquanto fotografava, foi guardado no bolso, e lido apenas algumas horas mais tarde; dizia o seguinte:

«Se quiseres jantar outra vez enquanto "as mariposas continuam a voar", vem esta noite quando tiveres acabado o trabalho. À hora que te convier.» (...)

Ao telefone:

«Tenho o teu bilhete. W.B. Yeats como mensageiro e tudo. Aceito o convite (...)»
(...)
Robert Kincaid ia na sua segunda cerveja e estava a guardar as máquinas quando Francesca entrou na cozinha. Levantou os olhos para ela.
"Meu Deus", disse suavemente. Todos os sentimentos, todas as buscas e reflexões, toda uma vida de sentir, buscar e reflectir se juntaram naquele momento. E apaixonou-se por Francesca Johnson, a mulher de um fazendeiro, de Madison County, Iowa, que muito tempo antes fora de Nápoles.
"Bem" - a voz tremia-lhe um pouco, estava ligeiramente rouco - "desculpa a ousadia, mas estás linda. (...)
Ela sentiu que a sua admiração era genuína. Desfrutou dela, deixou-se invadir e rodear por ela, entrar-lhe por todos os poros como um óleo suave das mãos de alguma divindade que a tinha abandonado anos atrás e agora regressara.
E nesse mesmo momento, apaixonou-se por Robert Kincaid, fotógrafo-escritor de Bellingham, Washington, que conduzia uma velha carrinha chamada Harry.

O que é que eu posso dizer? Esta é a história de uma mulher que, em poucos dias, viu a estabilidade da sua vida ser abalada pela chegada de um homem que transformou a sua vida monótona, feita de dias sempre iguais, numa experiência inesquecível, sob a forma de um amor intenso, daqueles que somente acontecem uma vez na vida, e apenas a alguns afortunados... Esta é também a história de um homem que, depois de ter corrido meio mundo, depois de algumas aventuras amorosas, vai conhecer, onde e quando menos espera, aquele amor profundo que o marcará para sempre.
É sem dúvida uma história cheia de emoção. Mas por mais que eu fale aqui do livro, nunca conseguirei reproduzir fielmente toda a sua força, portanto, o que posso fazer é aconselhar a sua leitura a quem ainda não o fez. Tenho a certeza que também ele trará mais emoção às vossas vidas. Depois digam-me alguma coisa. 

... ficaram durante bastante tempo abraçados. E ele murmurou-lhe:

«Só tenho uma coisa a dizer, apenas uma; nunca voltarei a dizê-la a ninguém, e peço-te que te lembres dela: num universo de ambiguidades, este tipo de certezas só existe uma vez, e nunca mais, não importa quantas vidas se vivam.»

Sem comentários: